Eu estou sofrendo de brainrot. Eu vejo os efeitos. Eu gasto muito mais tempo do que eu gostaria com meu celular. Horas perdidas entre Twitter, Instagram, Youtube, e outros. Mas se você me perguntasse, eu não diria que é isso que eu gostaria de fazer. Os efeitos são claros. Minha leitura está diminuindo drasticamente. Horas parado em algum lugar e não aproveitando o que está ao meu redor. Rezar é mais difícil, e oração mental mais ainda. “Com efeito, não faço o bem que quero, mas o mal que não quero, isso eu pratico.” (Romanos 7:19). É um vício mesmo. A tela é a primeira coisa que vejo no início do dia, e a última ao deitar.
Estou em Paris, dentro da Sacré-Coeur, de frente a Nosso Senhor, presente no Santíssimo Sacramento. No meio de toda esta beleza abundante das obras de arte, a vontade de pegar o celular tira a minha atenção. Eu me desafio então. Agora são 12h30, ficarei 30 minutos em silêncio, tentando ter um tempo de contemplação que um dia já foi mais fácil. Mas as distrações, o pecado, e a ignorância são como nuvens pesadas e escuras que tampam a minha visão.
Um profundo incômodo toma conta de mim. É desconfortável este silêncio. É uma real abstinência. Mas preciso perseverar, ainda não se passaram nem cinco minutos. Continuo. Fica um pouco melhor.
Mas logo sou interrompido. Desta vez não veio do meu interior, mas uma mulher velhinha francesa vem conversar comigo. De todas as pessoas que se encontram aqui sentadas, fui escolhido. Em sua mão ela carrega um panfleto, e não consigo entender muito bem o que está acontecendo. Veja, infelizmente o meu francês já não é senão uma fração do já foi um dia. Hoje sobrevivo só com o mais básico, e muita dificuldade. A maioria das conversas são fingindo que estou entendendo e tentando notar se alguma pergunta foi feita.
Primeiro era um convite para algum evento que aconteceria na paróquia que vinha aquele panfleto. Todas as quintas, às 18h15. Mas vou embora na quinta de manhã. C’est pas grave, ela diz, passa no YouTube também, e começa a procurar algo na mochila até encontrar uma caneta que ela usa para escrever os detalhes no panfleto. Do que se trata o evento ainda não entendi, a leitura do francês também sofreu bastante. O panfleto diz: “Lê phénomène des prières de guérison”. Mas continuo ouvindo, ela tinha mais para falar e não precisava que eu dissesse muito, só prestasse a atenção, já que se eu olhasse pro panfleto em vez de ouvir o que ela estava falando, ela puxava a minha atenção de volta.
Ah como eu queria entendê-la. Dos fragmentos que eu entendia, parecia incrível o que ela estava dizendo. Acho que em certa hora ela já tinha parado de falar do evento e começado a falar da paróquia em si, como era uma comunidade incrível, e tinha bons jovens que poderiam ser meus amigos. A conversa prosseguia, mas minha mente começou a pensar qual seria o significado disto tudo. Em certo momento, eu falei que eu era do Brasil, e que eu me casaria no ano que vem. E ela respondeu com uma pergunta e começou a falar o que imagino que seriam bons conselhos, se eu só fosse capaz de compreender um pouco. Mas quase nada infelizmente.
Até que enfim, ela começa à despedir, essa parte eu entendo, eu agradeço ela, e ela vai embora. Olho para o relógio e são 12:57. O meu tempo de silêncio com Deus terminou-se. Depois, fiquei aqui sentado contemplando o altar que foi lindamente iluminado pela luz do sol, e como Maria, conservando todas estas coisas, meditando-as em meu coração (cf. Lucas 2:19).